Na leitura da obra de Helena Ferreira fui encontrar o rigor intelectual e académico de exposição das teses contraditórias sobre a origem da Revista à Portuguesa, mesmo que, naturalmente, a autora tenha a sua preferência e a não esconda. Este facto, aliado a um exaustivo percurso histórico ? e seu enquadramento ? da Revista à Portuguesa, através da observação e análise crítica dos cartazes, fazem do lido uma fonte de novas abordagens ? ou abordagens a partir de outros ângulos ? que nos remetem o imaginário para os tablados onde acontecia o anunciado. Mas, a par deste aspecto historiográfico e de apontamento crítico de natureza teórica, como encenador e dramaturgo ? embora a Revista à Portuguesa talvez seja precisamente o único género que só conheço do lado da plateia ? fico feliz com o pormenor e mergulho num género caracteristicamente português, seja qual for a dominante da sua origem, ainda por cima em declínio. Não sou dos que, mesmo na condição de espectador, aprecie particularmente o género, apesar de nele estarem bons amigos e excelentes profissionais; porém, tal não me impede ? julgo que até me autoriza a dizê-lo com mais à vontade ? que entendo que há muito que a Revista à Portuguesa devia ser conservada e protegida, à semelhança da Zarzuela em Espanha ou dos Sainetes na Argentina. Esta falta mais ? entre tantas e calamitosas ? falhas do Estado Português na vida artística e do nosso património popular, ao menos se atenua na e com esta obra de Helena Ferreira, ajudando ? e muito ? a perpetuar em registo, o que alguma intelectualidade lusa recusa aceitar ou classifica como coisa menor. Menoridade intelectual que não partilho e me faz ficar contente ao vê-la como objecto de estudo assente no que, de bom e de mau, são as nossas raízes (venham de Gil Vicente ou de apenas há um século e tal, chegadas, no início como cópia das Révues Parisiennes). Sobretudo quando e porque estamos numa grave circunstância histórica de perda da nossa independência e identidade nacionais: economicamente, sim; mas também ? e com responsabilidades vindas de antes de quem reconhece estas outras duas ? culturais. Porque é bom nunca esquecer que um povo sem memória é sempre mais fácil de abater e dominar. Castro Guedes, Encenador Abril de 2014