Para aumentar ainda mais o fosso entre os abençoados e os rejeitados por um deus menor, vem o drama da guerra. Como é tortuosa a sina de uma mãe, quando tem o azar de parir um rapaz. Algum dos presentes já imaginou vestir a pele daquela mãe? Ter uma vida, já de si madrasta e parir um filho para ser carne de canhão? Alguma vez sentiram o drama destas mães e o desespero dos pais, impotentes, perante saqueadores com leis de poder absoluto, os senhores das suas vidas e dos destinos! Nós consentimos que alguém absorva os poderes absolutos para decidir sobre a vida de cada um, com o negócio da guerra. Como somos capazes de assistir às mais cruéis atrocidades, sem nos revoltarmos? Por vezes, penso que esta não é a minha pátria, pois não me revejo neste quadro. Não são estas as minhas raízes.
A plateia, entusiasmada, saudava as palavras enfeitiçadas, cheias de golpes incisivos, desferidos por aquela língua afiada. Este era o Cónego João, sem mordaças nem medos. Nunca fora um homem de meios-termos. Gostava de chamar os bois pelos nomes. Se lá estavam bufos, não se conseguiam vislumbrar, tal era a euforia contagiante. Naquela noite, ninguém soube a cor do medo. Sentiam-se a remar todos para o mesmo lado e, talvez, pioneiros, na abertura de fileiras para outros poderem passar a sua mensagem.
Os momentos são sempre marcos importantes nas nossas vidas, se forem levados com um sentido único, o de mover montanhas.